A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) estabelece a obrigatoriedade da educação básica dos 4 aos 17 anos de idade, sendo obrigação dos pais efetuar a matrícula dos filhos a partir dos 4 anos de idade na rede regular de ensino.
Logo, a educação é dever da família. Quando ocorre o cancelamento da matrícula escolar, deve ser apresentado o atestado de vaga para outra escola, visto que o processo de aprendizagem da criança e do adolescente não pode ser interrompido. Essa é a forma de o Estado, pelas Instituições de Ensino, públicas ou privadas, exercer o seu “papel fiscalizador”.
Contudo, o contexto de pandemia trouxe situações atípicas e inesperadas às relações entre famílias e escolas, quando, nem sempre a manutenção do contrato de prestação de serviços educacionais é possível, optando a família por rescindi-los, momento em que exigia-se o atestado de vaga de outra instituição de ensino.
Nesse contexto, é preciso que se diga que, mesmo sendo um “dever” da Escola exigir o atestado de vaga, para que se tenha a certeza da continuidade dos estudos daquele aluno, paradoxalmente, não se pode condicionar a sua entrega para o efetivo cancelamento do contrato de prestação de serviços educacionais, que contém diversas obrigações, principalmente aquela de pagamento das parcelas vincendas de anuidade do respectivo ano letivo (não pode a família ficar obrigada ao pagamento daquilo que não quer mais).
Nesse momento de pandemia de COVID-19, algumas questões precisam ser resolvidas: o contrato deve ser cancelado e, consequentemente a matrícula do estudante, mesmo sem o atestado de vaga? Está-se diante de uma situação de abandono intelectual, que ensejaria da escola as seguintes providências? (a) a comunicação ao Conselho Tutelar e (b) o preenchimento do FICAI – Ficha de Comunicação de Aluno Infrequente.
A primeira questão que se esclarece é que configura conduta abusiva da instituição de ensino exigir o atestado de vaga, para o cancelamento do contrato de prestação de serviços educacionais, independentemente da existência da pandemia de COVID-19.
A segunda questão é que, com o cancelamento do contrato sem o respectivo atestado de vaga, deve ser comunicado o Conselho Tutelar a respeito do desconhecimento de que aquela criança e ou adolescente irá permanecer integrada ao sistema regular de ensino, para que então ele realize as averiguações necessárias e identifique a efetiva ocorrência de abandono intelectual.
A terceira e última questão está em esclarecer se deve ser preenchido o FICAI, uma vez que, ao menos em tese, esse estudante não está matriculado em nenhuma instituição e, portanto, passa a ser um aluno infrequente.
Sua permanência fora de uma instituição de ensino, contudo, pode se dar basicamente por três questões: porque as estruturas administrativas estão operando em sistema de home office, ou porque ainda não iniciaram os processos de matrículas/rematrículas, ou ainda, porque lhes falta condições financeiras para permanecerem vinculados à instituição de ensino particular.
Para tentar equalizar esse problema, o Ministério Público Estadual lançou a Nota Técnica Conjunta n.º 02/2020 do CENTRO DE APOIO OPERACIONAL DA INFÂNCIA, JUVENTUDE, EDUCAÇÃO, FAMÍLIA E SUCESSÕES e PROMOTORIAS REGIONAIS DE EDUCAÇÃO, em que são dados os esclarecimentos e orientações às demais promotorias regionais, a respeito do uso/preenchimento da FICAI, pelas instituições de educação básica, nas seguintes situações:
Obrigatoriedade do seu preenchimento: Quando o sistema de ensino público já se encontra aberto para realização de matrículas, rematrículas, transferências ou simples inscrição para vaga, do aluno, seja na forma presencial ou remota, seja diretamente junto ao estabelecimento de ensino ou mediante central de matrículas, para a etapa ou modalidade de ensino de que necessita. Como isso já permitiria que a família do aluno obtivesse o “atestado de vaga”, ou documento equivalente, e mesmo assim a família não o fornece/apresenta à instituição de ensino privado, sem qualquer justificativa. Configura-se a situação de abandono escolar.
Dispensa do seu preenchimento: Quando o sistema de ensino público ainda não autorizou a realização de novas matrículas, rematrículas, transferências ou simples inscrição para vaga, o que impediria a família do aluno de obter o “atestado de vaga”, ou documento equivalente. Não se configura situação de abandono escolar.
Atenção: em ambos os casos deve-se comunicar o conselho tutelar e o ministério público acerca do cancelamento da matrícula e da ausência de atestado de vaga de outra escola, para que estes atuem promovendo a reinclusão do estudante ao sistema regular de ensino.
Por fim, as instituições de ensino deverão solicitar declaração dos responsáveis legais do estudante com o comprometimento de que eles o matricularão na rede regular de ensino assim que possível, e de que cópia de tal declaração será encaminhada ao Conselho Tutelar, para conhecimento e organização de um cadastro de alunos, objetivando posterior busca ativa para a realização da matrícula escolar, no momento oportuno.